sábado, 1 de fevereiro de 2014

Todas gostam de bombom

        Esses enjoos de gravidez são terríveis. Com o estômago vazio, são bem piores. Mas, não havia nada que pudesse comer. O jeito era aguentar e continuar bordando aquele pano de prato. Quanto mais cedo entregasse, teria o dinheiro nas mãos. De repente chega a vizinha com o pagamento da passação da roupa. Graças a Deus, ainda não eram 10 horas, poderia ir até a padaria comer alguma coisa. Ajeita uma roupa no filho, lá fora o frio estava "de lascar". Vai andando o mais rápido que pode devido aos passinhos dele. Está alegre devido ao pagamento. 
É conhecida por todos no bairro e a dona da padaria a recebe com um sorriso. 
– Vai ganhar um "Sonho de Valsa", hoje, ela diz.
– Uai, vou, por quê? - responde a mãe.
– Seu marido passou aqui e pegou um, diz a senhora.
–Ué, por que será? Ah, que bom! - retruca a mãe, preparando-se para pagar os pães e o leite.
–Ele pegou o bombom na sua conta. Como você não gosta de ficar devendo, quer que cobre agora?
A mãe leva um pequeno susto. Como ele compra um bombom na sua conta? Não tinham como ficar tendo esses gastos. Bombom era um luxo! Ela mantinha a conta somente para uma emergência e para comprar leite para o filho. Mas pensou que depois, talvez, não tivesse como pagar o bombom. Concordou que cobrasse o valor da guloseima, ainda que a contragosto.
–Bobagem essa sua de não querer ficar comprando o que precisa. Você é uma boa freguesa. Pode comprar quando quiser – arremata a dona.
– Não, Dona Maria, não é bobagem. A gente deve gastar só o que pode pagar, responde a mãe, já agradecendo e saindo da padaria.
Havia um evento na cidade com apresentações de duplas sertanejas e por isso a rua estava cheia de gente, apesar da hora. Ela foi andando mais devagar e observando os grupinhos de pessoas nas calçadas e portas de bares. Esperava ver o marido que, segundo a Dona Maria havia lhe comprado um bombom. Não ficara muito satisfeita devido ao gasto inconsequente, naquelas circunstâncias, mas um Sonho de Valsa?!
Repartiria com os três, dava pra sentir o gostinho. 
Achou esquisito, pois não vira o marido. Onde será que estava? Com certeza  se desencontraram e ele já estava em casa. Saiu da avenida e dirigiu-se para o largo, um terreno bem grande de terra batida, onde aconteciam os ensaios para o carnaval e onde acampavam os circos e parques que costumam visitar cidades do interior. Era lugar ermo e mal iluminado mas valia a pena por ser um atalho. Apertou a mãozinha do filho como buscando coragem e apertou o passo. Olhando em volta receosa, de repente ela vê debaixo do poste. Reconhece a jaqueta, o vulto debruçado em cima de outro vulto. Respira fundo, nenhuma outra reação.  Apenas pensa que outras também devem gostar de bombons. Dirige-se para casa pensando que tem que terminar o bordado ainda hoje.


Lécia Conceição de Freitas

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