sábado, 27 de junho de 2015

Amanhã será um lindo dia!



Eu recomecei! 
Recomeçaria quantas vezes me fosse concedido!
 Louvado seja!

A poeta mineira


Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Adélia Prado, em Bagagem 



Achou esquisito, pois não vira o marido. Onde será que estava? Com certeza se desencontraram e ele já estava em casa. Saiu da avenida e dirigiu-se para o largo, um terreno bem grande de terra batida, onde aconteciam os ensaios para o carnaval e onde acampavam os circos e parques que costumam visitar cidades do interior. Era lugar ermo e mal iluminado mas valia a pena por ser um atalho. Apertou a mãozinha do filho como buscando coragem e apertou o passo. Olhando em volta receosa, de repente ela vê debaixo do poste. Reconhece a jaqueta, o vulto debruçado em cima de outro vulto. Respira fundo, nenhuma outra reação.  Apenas pensa que outras também devem gostar de bombons. Dirige-se para casa pensando que tem que terminar o bordado ainda hoje.

Lécia Conceição de Freitas em Memórias













terça-feira, 16 de junho de 2015

O adolescente e a escola

Constitui-se preponderante o papel da escola na edificação do sujeito, com grande responsabilidade no processo educativo.
A educação acha-se incluída entre os fatores culturais de um povo, permanecendo subordinada às relações de poder vigente. É reconhecido que a classe dominante determina o tipo de educação que se pretende para a nação. Então, o indivíduo que não se enquadra nos requisitos culturais previamente estabelecidos será considerado sem cultura, sofrendo de “carência” ou “privação” cultural  sendo, portanto, marginalizado.
Por definição todo grupo social tem um tipo qualquer de produção cultural, não existindo nenhum com ausência de bens culturais.  O que  na verdade acontece são as marcantes diferenças, não respeitadas pelas metodologias e instrumentos de ensino. A privação cultural seria então um atributo artificialmente estabelecido, mas que se constituirá uma barreira social. A consequência mis direta, frente às desigualdades, será a incapacidade dos jovens de definirem projetos de vida viáveis, condizentes não só com as aspirações, mas também com a possibilidade de realização.
Conclui-se, então, que a escola pode educar e construir, mas, igualmente, pode marginalizar e destruir, favorecendo a instalação de risco.
Uma das grandes questões vinculadas à escola tem a ver com a evasão e com o fracasso escolar.  Entre as causas sociológicas do fracasso escolar são apontadas as restrições impostas pelas condições sociais, econômicas, geográficas e culturais, que favorecem a pobreza.
Existem desvantagens reconhecidas nas classes menos favorecidas para o desenvolvimento de aptidões intelectuais, pela diferença de valores que envolvem diretamente a escola. Entre elas destaca-se a dificuldade de linguagem, principalmente para as minorias étnicas, que devem se adaptar ao uso de uma língua na qual não aprenderam a se expressar ou mesmo a pensar.
Problemas relacionados ao atraso escolar frequentemente ligados à evasão escolar, podem  ser pensados sobre o ponto de vista de dano imediato ou mediato. O imediato se liga à interrupção do aprendizado, enquanto o mediato leva à impossibilidade futura  de participação plena na sociedade e perpetuação dos ciclos de pobreza e fome, com projetos medíocres ou inexistentes.
           As causas psicológicas, que não estão obrigatoriamente relacionadas com as condições socioeconômicas, também são consideradas fatores de risco, como a instabilidade familiar, a desestruturação que trazem consigo, a insegurança, o não pertencer, tanto para crianças quanto para adolescentes. Deve-se ter presente que a aprendizagem tem caráter gradual acumulativo, podendo os agravos surgidos em qualquer momento da vida comprometer o processo a partir daquele ponto ou até mesmo definitivamente.

                                                                                                         Maria Ignez Saito

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Canção na plenitude


Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)
O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.
Lya Luft, em Secreta Mirada